Antes de começar a ler este artigo é importante que você leitor saiba que Vereador não recebe salário, recebe subsídio. É importante se conscientizar das diferenças entre salário e subsídio, que na verdade, são bem substanciais.
No Carnaval de 1999 aconteceu um fato que merece lugar especial na memória da cidadania ivaiporaense. Os vereadores de então elevaram seus próprios subsídios de R$1.682,00 para R$2.700,00, um aumento de 62%. Curiosamente este percentual equivalia à maxi-desvalorização do real frente ao dólar na crise que estourara à época. O povo brasileiro morrendo de medo do retorno da hiper-inflação e os vereadores mais que depressa trataram de salvar seus poderes de compra em dólar. Aquele episódio foi recheado de trapalhadas. Os vereadores de então, realizaram três sessões extra-ordinárias a toque de caixa, as vésperas do Carnaval, para que o Edital da Lei fosse publicado no Jornal Paraná Centro em letras minúsculas, encobertas pelas distrações da “festa da carne”. Meu amigo e companheiro partidário, Dr. Ademir Prudêncio da Silva, o popular Toro, casualmente ouviu falar do fato e instado por sua virtuosa indignação, interrompeu seu passeio à praia e voltou para Ivaiporã para me instar também a alguma ação direta. Na quarta-feira de cinzas participamos de programa matutino da Rádio Ubá e escancaramos o que pensávamos daquela ilegalidade tosca e rasteira. Ao sairmos da Rádio Ubá, um pequeno grupo de outros cidadãos como Celestino Júnior, Sergio Chaves, Elso Bittencourt, Paulo Afonso Ribeiro, estavam prontos para a ação. Rodamos um panfleto, convocamos uma reunião do que idealizáramos como Movimento Pela Ética na Política de Ivaiporã, com repercussão na mídia estadual, logo o então conselheiro, hoje presidente do Tribunal do Contas do Estado do Paraná, Nestor Baptista, manifestou-se dizendo que o aumento dos vereadores de Ivaiporã era ilegal e imoral. Dessa época começou-se a utilizar em circunstâncias políticas-administrativas em Ivaiporã, a cínica justificativa: “Ah! Não é moral, mas é legal!” Credo!
Para se ter idéia do que isso significou, Ivaiporã teria gasto a mais com salários de vereadores entre março de 1999 e dezembro de 2007, algo em torno de R$1.500.000,00. O que daria para fazer com um milhão e meio de reais? Mas aquela Legislatura ainda (1997-2000) ainda teria aumentado os subsídios dos Vereadores, de R$1.682,00 para R$2.054,00. Dizem que acompanhando reajuste salarial dos funcionários públicos municipais.
Agora, no apagar das luzes de 2008, os Vereadores da Câmara Municipal de Ivaiporã aprovaram aumento aos próprios salários, saltando dos atuais R$2.054,00 para R$3.400,00 a partir de janeiro de 2009. Um reajuste de 65%. Diriam os vereadores atuais (três deles eram vereadores no Carnaval de 1999), que o reajuste não vale para seus próprios salários, mas para a próxima legislatura. Mas não estariam eles interessados em se reelegerem neste ano para mais quatro anos de mandato com salários melhores? Seria justo se o próprio povo pudesse dizer quanto deve ser o salário de um vereador.
Sinto-me a vontade para escrever sobre isso porque fui vereador na legislatura passada e sempre tive um posicionamento muito claro na defesa de enxugamento de gastos da Câmara Municipal, inclusive se levantado contra as iniciativas de colegas quanto a possíveis reajustes de ganhos dos “nobres edis”. Logo que assumi o mandato de Vereador em 2001, lembro-me de, ao ver um dedicado servidor da Secretaria transcrevendo a fita de áudio de uma Sessão Ordinária da Câmara, indaguei esperando simplesmente um sim:– Isso dá trabalho, heim?! Ele me surpeendeu:– Agora sim! Insisti: – Mas porque agora? Completou ele: - Agora tem você que discursa, e desafia os outros a discursarem. Agora as sessões chegam a quatro horas de duração! Insisti novamente: - Mas antes não era assim? – Não... Antes as sessões duravam cinco, dez minutos no máximo. Parece absurdo, mas sabendo do meu respeito à Lei, algumas vezes, durante a Legislatura em que fui Vereador, alguns colegas tiveram a coragem de pedir para mim: - Ah! Cyro, não vamos vir nesta sessão extraordinária de amanhã não. Vamos só assinar a ata e pronto! Ou então: - Ah! Cyro, não discursa não, vamos acabar essa sessão logo, eu tenho que ir numa ‘leitoa no tacho’...
Vejam bem onde quero chegar com tudo isso: com uma Sessão Ordinária por semana, depois das 18 horas, todos os vereadores podem ter uma outra atividade econômica e remunerada, como normalmente acontece. Claro que o vereador não tem apenas as Sessões Ordinárias para participar. Tem também as Extraordinárias. Tem as reuniões das Comissões Temáticas, tem que fiscalizar o Poder Executivo em diversas situações. Mas normalmente os vereadores não fazem nada, a não ser participar das Sessões Ordinárias cuidando para não ter faltas que levem a perda de seu mandato. Pior: há vereadores participam das sessões apenas de corpo presente, sem fazer jus à atividade parlamentar, que deriva do verbo italiano ‘parlare’ – falar.
É nesses termos que, quando disseram para mim por mais de uma ocasião: - Olha Cyro, vamos colocar em pauta um projeto de Lei para reajustar os ‘nossos’ salários. Você não precisa votar a favor é só ficar quieto... Sempre deixei claro que se entrasse em pauta tal matéria eu conclamaria o povo para derrotá-la. Por isso nunca entrou. Mas no final de meu mandato como Vereador... logo após o Natal de 2004, eu havia perdido as eleições como candidato a Vice-Prefeito de Geomar Torres e, o único Vereador que se reelegera para a Legislatura atual era justamente o então presidente Antônio Vila Real. Curiosamente ele não assinou, mas vários outros Vereadores assinaram um projeto de Lei criando um pagamento para os Vereadores participarem de Sessões Extraordinárias e ele convocou, para os últimos dias do ano, talvez dias 27, 28 e 29 de dezembro, três Sessões Extraordináras, às 8 horas da manhã, Câmara vazia e, contra o meus discursos ao vento e contra o meu voto e de algum outro vereador os tais ‘jetons’, pagamentos por Extraordinárias, foram aprovados.
Naqueles dias tentei mobilizar pessoas, tentei achar espaço para falar, mas o ano se acabava, alguns já estavam viajando, outros embebidos pelo sabor das festas, outros torcendo para que o meu mandato de vereador se acabasse... Fui vencido pelo silêncio e pelo comodismo. A única coisa que consegui fazer foi denunciar aos órgãos competentes.
Mas há algo de engraçado nesta história. Sabe-se que Antônio Vila Real, reeleito e eleito mais uma vez presidente da Câmara, fez uso de convocações de Sessões Extraordinárias para alegrar seus pares. Mas há alguns meses, o Tribunal de Contas do Estado do Paraná, considerou ilegal o pagamento de Sessões Extraordinárias e condenou os Vereadores a devolverem o que receberam ilegalmente.
Agora, não estou dizendo que os atuais Vereadores cometeram alguma ilegalidade, mas se analisarmos a quantidade de trabalho despendida pelos vereadores, a qualidade do trabalho legislativo apresentado pela média dos edis, as carências que a população de nossa cidade sofre, se levarmos em conta isso eu acho que um aumento nos subsídios dos Vereadores de Ivaiporã é imoral. Para se ter uma idéia, serão mais de R$660.000,00 que a próxima administração municipal deixará de gastar com o povo ao longo de 4 anos, para pagar este aumento aos “novos” Vereadores.
O trabalho do Vereador, como o do Prefeito ou qualquer outro cargo eletivo, não deveria ser encarado como meio de se defender interesses pessoais e particulares, mas como uma missão de servir aos interesses da comunidade em geral.